LERROY TOMAZ | A estrutura federativa que dá forma ao Brasil traz consigo desafios inatos. A descentralização, característica do federalismo, consiste na existência de pessoas jurídicas capazes de atuarem politicamente de forma autônoma, desde que guiadas pela Constituição Federal. As críticas ao modelo se dão, em sua maioria, no tocante à desproporção entre o estabelecimento de atribuições e a repartição de recursos.
Embora o cotidiano da população se dê nos municípios, a fatia mais generosa do chamado “bolo tributário” fica concentrada na União, que o reparte mediante critérios previstos no pacto federativo. Entretanto, a crescente participação de estados e municípios no custeio de serviços essenciais, tais como saúde, educação e segurança, tem acentuado a discrepância.
Nesse sentido, a pandemia do coronavírus, que levou o país ao estado de calamidade pública vigente desde março de 2020, trouxe contornos de dramaticidade a tal cenário. Isso porque, superada a fase inicial de completa incerteza acerca da doença, deu-se início a uma verdadeira corrida mundial pela vacina, única porta de retorno à normalidade da vida em sociedade.
A ciência, para a decepção dos negacionistas, venceu. Mundo afora, diversos imunizantes têm se revelado eficazes na proteção contra a covid-19. Localmente, gestores probos e competentes se anteciparam, dentro de suas possibilidades e diante da inação inicial do Governo Federal, adotando providências preliminares à vacinação propriamente dita. Apartadas as preferências ideológicas e conveniências político-partidárias, fica cada vez mais claro que os homens e mulheres responsáveis pelo trato da coisa pública devem inspirar e liderar pelo exemplo.
Seja pela celebração de acordos com farmacêuticas desenvolvedoras de vacinas, seja pela aquisição de insumos, tais como agulhas, seringas e freezers armazenadores, parte dos brasileiros foi beneficiada pela ação de governadores e prefeitos responsáveis. Agora, enquanto o Brasil assiste às cenas de vacinação em diversos países, inclusive da América Latina, a superação de entraves burocráticos e a liberação pelas autoridades sanitárias competentes para o início da imunização local são aguardadas.
Segundo o Programa Nacional de Imunizações, criado em 1973, as vacinas são um direito popular e devem ser asseguradas a todos os brasileiros. Nesse sentido, observada a competência tripartida entre União, Estados e Municípios, fixada pela Constituição em matéria de saúde, espera-se do Governo Federal a coordenação nacional das estratégias de vacinação onde as mesmas já não tenham sido desenhadas. Enquanto isso, os municípios, de um modo geral, devem assegurar a existência de equipes de saúde capacitadas, bem como a disponibilidade de insumos e infraestrutura suficientes para o atendimento da população.
Vencida a pandemia e suas sequelas sociais, fica o apelo aos parlamentares, encarregados da condução dos projetos de reforma tributária em tramitação no Congresso, para que cuidem de reorganizar a distribuição das receitas, priorizando, sobretudo, o fortalecimento dos Municípios. Só assim, prefeitos serão capazes de fazer frente às demandas da população de maneira qualificada. Apenas com a superação da lógica invertida de centralização de receitas e descentralização de despesas haverá melhora substancial na qualidade dos serviços públicos ofertados à população, notadamente em cenários de crise, a exemplo do deflagrado pelo coronavírus.
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